O ano é 1964. O mês, abril. Os militares recém concretizaram um golpe de Estado contra o Governo de João Goulart e tomaram o poder com reação tímida da população e da imprensa. Quase sozinho, Carlos Heitor Cony, autor da coluna “Da Arte de Falar Mal”, bate duro nos golpistas. A “revolução dos caranguejos”, como ele chama, representa um atraso na história do País, um atentado contra as liberdades e os planos desenvolvimentistas nacionais encarnados em figuras como as dos ex-presidentes JK e Getúlio Vargas. Seus líderes são “gorilas”, que transformam a delação em política de estado e afrontam direitos elementares ao prender cidadãos “subversivos” sem provas ou julgamentos.
O livro que reúne esses textos – O Ato e o Fato – é um documento interessantíssimo dessa época e da atuação do jornalista e cronista. Editorialista e cronista do Correio da Manhã, veículo profundamente crítico ao governo Jango, ele já mostrou em seu primeiro texto de abril, um dia após o Golpe, que as coisas seguiam no rumo errado. A partir dali, manteve-se durante meses na crítica aos militares (foi alvo de um processo movido pelo então Ministro da Guerra Arthur da Costa e Silva).
Os textos de O Ato e o Fato mostram um cronista corajoso, crítico e defensor de um humanismo que deve ter sido adquirido nos tempos de seminário, onde ficou dos 12 aos 19 anos.
Humanista e aparentemente pouco preocupado em agradar. Cony já foi alvo de críticas variadas. Há quem diga que os editoriais do Correio da Manhã do período anterior a abril de 64, duríssimos na crítica ao Governo, contribuíram com o Golpe. As crônicas reunidas em O Ato e o Fato colaboraram para melhorar a imagem do autor junto à esquerda, isso até ele queimar algumas pontes quando lançou Pessach: A Travessia, um ótimo livro que desagradou profundamente aos defensores da luta armada contra os militares. Poucos anos depois, em 74, Cony lançaria Pilatos, sua obra-prima. Um livro absurdo e fantástico que segundo a orelha é uma “advertência aos que, julgando-se felizes, são apenas desinformados”.
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Sobre o autor:
Rogério Kiefer ( @rogeriokiefer) é jornalista e sócio-diretor da All Press Comunicação.
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